sábado, agosto 23, 2025

Ninguém lê mais

 Ninguém lê mais.


Ninguém lê mais, ninguém escreve mais.

Sem querer ser generalista, mas antes as pessoas escreviam mais, amadoramente falando, seja em diários, ou até em blogs. Hoje se sabe que não se será escutado no geral se fizer uso da escrita. Calha mais um vídeo ou uma mensagem de áudio no whatsapp. 


Escrever é processar pensamentos, construção de identidade, de vivência, a gente não tem tempo pra digerir nada, é tudo em corte seco, editado preguiçosamente no capcut e feito pra não durar. Eu tenho o hábito de escrever, de tempos em tempos, principalmente quando não estou em terapia, para tentar me entender e processar minhas vivências da melhor forma.


O porquê sinto esses sentimentos, o que é válido e o que não é.


Eu hoje sinto raiva. Não sei bem porque sinto raiva, pelas frustrações que ando passando na vida? Frustrações amorosas, frustrações como artista, frustrações como profissional?


Mas o fato é que às vezes gosto sim de sentir raiva. Me mantém focado, me dá energia. Canalizo a raiva para algo que me traga produtividade, ideal para esse mundo neoliberal. Me foco melhor, desenho melhor, com traço firme. Em 2004 percebi isso, um amigo no trabalho que me fez uma raiva, percebeu e disse que desenho melhor com raiva, nunca me esqueci disso. Com raiva também que corri minha primeira meia maratona, durante a pandemia. 


A raiva por vezes é o que me faz sentir vivo, nesse mundo que nos faz ser tão apáticos. A tristeza pode ser paralisante, eu particularmente no meu quotidiano me acho uma pessoa melancólica, mas não melancólica de uma maneira triste, mas sim com um olhar sensível perante as coisas. As coisas me comovem demais, mas toda minha construção me faz manter isso debaixo da carapaça. A raiva eu deixo transparecer, por vezes, de maneira errada, mas mesmo assim, deus, como é bom sentir raiva. Inclusive de você, deus. Que deus me proteja da apatia.


Um vizinho muito estranho do meu prédio onde divido apartamento com minha irmã, sempre pergunta dela para o porteiro, ele fica também sempre zanzando e olhando de forma estranha para as meninas de biquíni na piscina. E eu hoje estava com raiva. No meu íntimo eu queria que ele aparecesse na minha frente para o confrontar, o que ele quer tanto saber de minha irmã.  Na real eu queria era intimida-lo, talvez até bater nele, com toda razão. Em meu discernimento ele representa o que somente é uma projeção do que eu idealizo como o que seria ideal pra mim, do que realmente é algo errado. Ele pra mim é um ponto que é justificável pra tal ato. Um predador, não é alguém que me frustrou simplesmente.  É somente alguém injustificável. É que nem bater em um nazista. Ou agir violentamente por sobrevivência.


Nick  Cave diz que faz “sad bastard songs”, acho que pessoas nesse filão de pensamento sempre se atraem. Não acho que Nick Cave seja uma pessoa triste, só acho que ele se comova fácil com o simples ato de estar vivo. Assim como outras pessoas nesse “estilo”.


Me taxam de triste, uma vez uma pessoa leu um dos meus quadrinhos e disse: “esse bicho faz uns quadrinho bom, mas ele corta os pulso”.  


Não sou isso. Sou mais profundo do que vocês imaginam.


Mas acima de tudo, sou mais raso do que vocês pensam.